Violações Massivas dos Diretos Humanos no Burundi

18 de abril de 2022

Burundi, pequeno país do continente africano, está localizado entre Ruanda, Tanzânia e República Democrática do Congo (RDC). Entre 1970 e 2015, o país viveu décadas de crises humanitárias, guerras civis, golpes de Estado e atrocidades massivas. Após o período colonial, o país viveu três guerras civis, dentre elas a mais sangrenta foi a travada entre 1993 e 2005, que resultou em mais de 300 mil mortos. Este conflito foi apaziguado por meio de um cessar-fogo pelo estabelecimento dos acordos de “Arusha”, que colocou Pierre Nkurunziza no poder, eleito pelo Parlamento e reeleito em 2010. 

O conflito de 2015, que deu vazão às disputas não equacionadas das guerras anteriores, iniciou com o anúncio do terceiro mandato de Nkurunziza. Isto violaria a Constituição de Burundi, que determina dois mandatos e os acordos de Arusha, feitos em 2000 e adotados em 2005, que findaram a guerra. Entretanto, Nkurunziza afirmou que a sua reivindicação do direito ao terceiro mandato era legítimo, já que o primeiro foi votado no parlamento, ato que considerou eleições não democráticas. O governo recorreu à violência excessiva e ocasionou uma onda de violação massiva dos direitos humanos.

Nkurunziza foi reeleito presidente, em julho de 2015, depois de uma tentativa de golpe fracassado, liderado por Godefroid Nivombare. A oposição tentou boicotar o escrutínio, desencadeando um aumento da violência. Em 2018, quando Nkurunziza descobriu seus opositores, ele mandou alterar a Constituição da República, afetando 97 dos 305 artigos estabelecidos, em 2005. Além disso, buscou centralizar os poderes no presidente, reduzindo o escopo das demais esferas do governo e do parlamento. Nkurunziza fez mudanças constitucionais para aumentar o mandato presidencial de cinco para sete anos e acabou com a dupla vice-presidência, pondo em causa a distribuição étnica entre “hutus e tutsis”, violando novamente os acordos de Arusha. Os grupos da oposição exilados tiveram bens apreendidos pelo Supremo Tribunal e foram perseguidos. 

Em 2019, novas leis étnicas foram criadas e promulgadas pelo governo, fechando trinta ONGs no país. O conflito teve larga participação de alguns atores, dentre eles destaca-se o Conselho Nacional de Defesa da Democracia-Forças de Defesa da Democracia (CNDD-FDD), partido no poder, criado como movimento rebelde da etnia hutu em resposta ao governo repressivo de tutsis no decorrer da guerra civil da década de 1990. Outro ator importante é o Imbonerakura, ramo militar do CNDD formado por jovens, cujos objetivos são proteger o partido e o seu presidente, e repreender qualquer opositor. 

Do lado da oposição, tem papel relevante o grupo formado por vários partidos políticos críticos ao governo de Nkurunziza, como o Forças de Libertação Nacional (FLN), Aliança para a Renovação Democrática (ARD) e a União para o Progresso Nacional (UPRONA). Estes movimentos formaram o Conselho Nacional de Respeito ao Acordo de Arusha para a Paz e Reconciliação no Burundi e o Estado de Direito (CNARED), uma plataforma que soma os opositores exilados mais fortes, todos os partidos políticos e oposição e os grupos da sociedade civil. 

Uma onda de protestos aconteceu entre 2015 e 2017, que resultaram em mais de 1200 mortes, 10.000 pessoas presas de forma arbitrária e 320 mil refugiados. O Imbonerakure começou uma caçada massiva a supostos opositores do governo e ativistas da sociedade civil.  A Comissão do CDHONU no Burundi concluiu que potenciais crimes contra a humanidade como execuções extrajudiciais e sumárias, desaparecimentos, estupros, detenções ilegais e tortura aconteceram durante o conflito iniciado em 2015.

Os países vizinhos não condenaram com veemência as ações violentas de Nkurunziza. A União Africana (UA), como afirmava os acordos de Arusha, solicitou que Nkurunziza desistisse de disputar o terceiro mandato, que desarmasse o Imbonerakure e que consentisse uma missão de observação. Em resposta, o governo do Burundi afirmou que concordaria com tais exigências sob a condição de revisão do conteúdo do relatório final enviado pela UA. Esta exigência do governo do Burundi foi negada.  Diante disso, a UA autorizou um destacamento de força militar de manutenção da paz e Nkurunziza ameaçou combater a missão. Só em 2018, a UA conseguiu enviar o Alto Comissariado para Paz e Segurança para o país, a fim de auxiliar o governo de Nkurunziza na organização das eleições. 

Outra instituição regional que ajudou a mediar o conflito foi a Comunidade de África Oriental (EAC). Todavia, ela foi criticada pela oposição a Nkurunziza pela aceitação do resultado das eleições de 2015 sem questionar as ações do governo, mesmo depois do seu assessor jurídico alegar que um terceiro mandato era ilegal.

Já o Conselho de Segurança das Nações Unidas (CSNU) buscou um papel mais ativo na crise, mas ficou condicionado pelas divergências dos blocos regionais africanos sobre a melhor forma de lidar com o conflito, que se dividiam entre defender a impossibilidade de Nkurunziza assumir um terceiro mandato ou achar a ideia equivocada e priorizar conter as violências. A Resolução 2303/2016 mobilizou 228 agentes, o que resultou em mais repressão e violações massivas .

O Burundi saiu do Estatuto de Roma em outubro de 2017, pouco antes do Tribunal Penal Internacional (TPI) abrir uma investigação sobre crimes de guerra cometidos naquele país. Em 2020, o Conselho de Direitos Humanos renovou o mandato da Comissão do Inquérito por mais um ano. Ainda em outubro de 2020, a União Europeia renovou “as proibições de viagem e congelamento de bens em quatro burundeses Boletín Ieee (2019)” por violações dos direitos humanos e incitação à violência. Em dezembro de 2020, o CSNU retirou as denúncias sobre o governo do Burundi, mesmo que as violações e abusos dos direitos humanos ainda ocorram.

Referências Bibliográficas:

GLOBAL. C. R2P, Burundi, disponível em: https://www.globalr2p.org/countries/burundi/ Acesso em 08 abril 2022.  

GLOBAL. C. R2P, Burundi, disponível em: https://horninstitute.org/wp-content/uploads/2019/02/Revitalizing-Responsibility-to-Protect-R2P-in-Burundi.pdf Acesso em 08 abril 2022. 

THE SENTINEL, P. – Burundi disponível em: https://thesentinelproject.org/?s=burundi Acesso, 08 de abril de 2022.

BOLETÍN. I. – La crisis política y humanitaria de Burundi número-16, 2019, disponível em: https://publicaciones.defensa.gob.es/media/downloadable/files/links/b/o/boletin_ieee_16.pdf Acesso, 08 de abril 2022.