17 de maio de 2021
No dia 25 de março de 2021, o canal de notícias Al Jazeera publicou uma atualização em seu website a respeito da crise no Iêmen. A guerra civil no país ultrapassou os seis anos, um novo alerta de onda de fome chegou ao país, representando uma das consequências de anos de ataques aéreos, morteiros, trocas de tiro, medo e destruição. Cerca de 10 milhões de iemenitas passam fome por conta dos conflitos, e segundo o Grupo de Peritos Eminentes e Peritos Regionais do Iêmen (GEE, em inglês), essa fome tem sido usada como arma militar pelos grupos envolvidos na guerra. Além disso, durante esse período, muitas redes de eletricidade foram desligadas e os hospitais foram destruídos ou ficaram sem suprimentos para tratar vítimas do combate; a distribuição de vacinas e outras ajudas humanitárias têm sido obstruídas pelos grupos envolvidos nos conflitos, especialmente os Houdhis.
A publicação aponta que cerca de 4 milhões de iemenitas saíram de suas casas por medo e mais de 20 milhões vivem em situação de necessidade. Todos os dias, mais destruição é presenciada, outra clínica, casa ou escola é atingida, mais pessoas tentam fugir de tiros ou bombas e mais crianças morrem de fome. Mais de 18.000 civis foram mortos e crianças representam ¼ dessas fatalidades, segundo dados mais recentes da ONG Save the Children.
Instauração do terror: luta pelo governo
Essa batalha teve início no ano de 2011, durante a primavera árabe, quando uma série de revoltas populares forçou o presidente Ali Abdullah Saleh a deixar o cargo nas mãos do seu vice, Abdrabbuh Mansour Hadi. Imaginava-se que o país caminharia para uma maior estabilidade política, porém, Hadi se deparou com problemas como os militares, que demonstravam sua lealdade ao antigo presidente, ataques da Al Qaeda e o surgimento de movimentos separatistas.
A particularidade dos ataques presentes no Iêmen é o caráter político e religioso que envolve as partes. Os Houthi são um grupo rebelde de minoria zaidita (dissidência do xiismo) com predominância no norte do Iêmen. O slogan do grupo é “Deus é Grande, Morte à América, Morte a Israel, Maldição aos Judeus, Vitória ao Islã” . Segundo uma reportagem feita pela BBC News, a Arábia Saudita alega que tais rebeldes são apoiados e financiados com armas pelo Irã (país de maioria xiita), mas o governo iraniano nega a declaração. Os Houthi lutam em oposição ao governo de Hadi, que por sua vez, é apoiado por uma coalizão internacional composta de países sunitas, como a Arábia Saudita e Estados ocidentais, como Reino Unido, França e Estados Unidos.
Em 2017, os Houthi romperam com o ex-presidente Saleh e conduziram seu assassinato. Tal aliança havia sido feita apenas visando a retomada do poder. As tropas da coalizão conseguiram expulsar o exército Houthi de grande parte do sul do país, no entanto, eles foram capazes de se estabelecer na cidade de Taiz, onde efetuaram disparos de mísseis em direção à Arábia Saudita. Apesar da força da coalizão, o presidente Hadi permanece em exílio. Em adição a tudo isso, membros da Al Qaeda e grupos ligados ao Estado Islâmico aproveitaram o caos vivenciado no país e tomaram territórios no sul.
Atuação da comunidade internacional
O Centro Regional de Informação das Nações Unidas (UNRIC) aponta o Iêmen como a maior crise humanitária do mundo. Os dados são extremamente preocupantes; desde 2015, o país se encontra em uma guerra civil e a crise humanitária envolve cerca de 80% da população. Cerca de 20 milhões de pessoas no Iêmen precisam de apoio humanitário. O UNRIC aponta que mais de 16 milhões sofrem de insegurança alimentar, e de acordo com o Escritório das Nações Unidas para a Coordenação de Assuntos Humanitários (OCHA), 5 milhões sofrem risco de morrer de fome. Os iemenitas padecem também com decadente acesso à água potável, e a falta de saneamento só agrava o risco de doenças transmissíveis. A coordenadora humanitária da ONU no Iêmen, Lise Grande, afirma que o Iêmen corre risco de enfrentar “a maior fome do mundo em 100 anos”.
O país se encontra assolada por crimes de guerra e contra a humanidade, pois não só ataques aéreos e lançamentos de mísseis têm sido feitos recorrentemente a construções civis, mas também são investigados desaparecimentos forçados e tortura por ambos os lados da guerra. O deslocamento forçado da população civil, prisões forçadas e violência sexual são outros traços que igualmente representam violações às Leis Internacionais de Direitos Humanos e Humanitárias. O secretário-geral da ONU, António Guterres, declarou em 2019, na conferência de doadores para a crise no Iêmen, realizada em Genebra, que: “Estou solidário com os milhões de iemenitas que sofrem. As Nações Unidas e a comunidade internacional, em geral, estão com vocês a cada passo do vosso caminho. Inshallah (se Deus quiser), juntos podemos acabar com o sofrimento no Iémen”.
O país se encontra no meio de uma crise econômica, política e sanitária. Enquanto a maioria dos países volta toda sua atenção e meios para o combate ao coronavírus, o Iêmen precisa fazer a divisão dos custos, levando em consideração todas as problemáticas que afetam o país. A ONU tem declarado a urgência com a qual a situação do Iêmen precisa ser encarada, e a organização tem atuado no país de forma direta através do Programa Mundial de Alimentos (PMA) e da UNICEF, assim como tem desempenhado um papel importante como intermediário na resolução do conflito. O Conselho de Segurança das Nações Unidas (UNSC) conseguiu, em 2019, aprovar uma missão no país. O objetivo era supervisionar e ajudar a implementar um acordo de cessar-fogo com a ideia de atingir um futuro acordo político mais amplo, com a finalidade de encerrar o conflito. Este foi o primeiro grande avanço diplomático e político significativo, em quase quatro anos de guerra.
REFERÊNCIAS
Aljazeera. Children 25% of civilian casualties in Yemen: Relief agency. Disponível em: <https://www.aljazeera.com/news/2021/3/23/children-25-of-civilian-casualties-in-yemen-relief-agency> Acesso em: 13 de maio de 2021.
Aljazeera. Yemen crisis: The devastating impact of six years of war. Disponível em: <https://www.aljazeera.com/gallery/2021/3/25/yemen-crisis-the-devastating-impact-of-six-years-of-war> Acesso em: 13 de maio de 2021.
BBC. Por que há uma guerra no Iêmen e qual é o papel das potências internacionais. Disponível em: <https://www.bbc.com/portuguese/internacional-46322964> Acesso em: 13 de maio de 2021.
Global Centre for the Responsibility to Protect. War crimes are being committed in Yemen as pro-government forces and a regional military coalition fight against Houthi rebels who still control much of the country. Disponível em: <https://www.globalr2p.org/countries/yemen/> Acesso em: 13 de maio de 2021.
UNRIC. Iémen: a maior crise humanitária do mundo. Disponível em: <https://unric.org/pt/iemen-a-maior-crise-humanitaria-do-mundo/> Acesso em: 13 de maio de 2021.