Decapitações de crianças em Moçambique

12 de maio de 2021

Recrudescimento da violência em Moçambique

Moçambique tem um histórico de atrocidades decorrentes de sua guerra civil de 1977-1992, durante a qual aproximadamente um milhão de pessoas morreram.  Crimes de guerra e crimes contra a humanidade foram perpetrados pelo grupo rebelde armado Resistência Nacional Moçambicana (RENAMO), que realizou massacres de civis e matou sistematicamente professores e trabalhadores da saúde. As forças armadas do governo também foram responsáveis por crimes de guerra. Um acordo de paz foi assinado em 1992, mas um conflito de baixo nível retornou entre 2013 e 2018. Apesar de um acordo de 2019, o grupo separatista “Junta Militar da Renamo”, continua a travar uma pequena insurgência.

Cabo Delgado e a violência que assusta a comunidade internacional

Localizada ao norte de Moçambique, fazendo fronteira com a Tanzânia, a província de Cabo Delgado é a principal afetada pela violência, uma região portuária e importante para o escoamento da produção de gás natural, uma das principais fontes de riqueza do país.. De acordo com Global Centre for the Responsibility to Protect, desde outubro de 2017, um grupo extremista armado, conhecido localmente como Al-Shabaab, se envolveu em uma violenta insurgência na província. O grupo tem efetuado ataques indiscriminados contra civis, incluindo decapitações, violência sexual e de gênero, sequestros, recrutamento forçado de crianças para combate e destruição de infraestrutura civil. Desde outubro de 2017, mais de 2.000 pessoas foram mortas e 670.000 deslocadas.

Segundo a Anistia Internacional, tanto Al Shabaab quanto as forças de segurança estatais, bem como uma empresa militar privada contratada pelo governo, cometeram execuções extrajudiciais e outras violações dos Direitos Humanos. De acordo com o Projeto de Localização de Conflitos Armados e Dados de Eventos, mais de 365 incidentes violentos ocorreram no norte de Moçambique durante 2020, resultando em pelo menos 650 civis mortos, incluindo dezenas de civis decapitados ou desmembrados, enquanto o Al-Shabaab ocupava temporariamente várias cidades em Cabo Delgado.

Os combates entre Al-Shabaab, forças do governo e milícias locais, bem como ataques de Al-Shabaab em aldeias, resultaram em milhares de civis deslocados chegando a Pemba, capital da província, desde outubro. Embora os combatentes do Al-Shabaab tenham sido os principais autores da violência contra civis, as forças do governo também foram implicadas em graves violações e abusos, incluindo prisões arbitrárias de indivíduos suspeitos de afiliação com o Al-Shabaab.

Embora o grupo extremista tenha começado como um pequeno grupo armado em 2017, seus ataques se intensificaram durante 2020. A disposição do grupo de perpetrar ataques indiscriminados contra civis aumenta o risco contínuo de atrocidades em Cabo Delgado. O Al-Shabaab explorou o descontentamento popular com a pobreza generalizada e as alegações de corrupção governamental no país para recrutar combatentes. As recentes ofensivas do governo e o impacto do ciclone tropical Eloise resultaram na diminuição dos combates durante janeiro e fevereiro, mas a ameaça às populações locais permanece.

Segundo o Boletim das Nações Unidas, nos últimos meses, mais de 9.100 pessoas – quase metade delas crianças – chegaram aos distritos de Nangade, Mueda, Montepuez e Pemba, fugindo da violência na vila de Palma em Cabo Delgado. Quase 670.000 – incluindo cerca de 160.000 mulheres e meninas adolescentes, bem como 19.000 mulheres grávidas – foram deslocadas internamente nas províncias de Cabo Delgado, Niassa e Nampula, a grande maioria delas vivendo com famílias anfitriãs, cujos escassos recursos estão acabando.

Atuação internacional no caso Moçambique

Em abril de 2020, a União Europeia encorajou o governo moçambicano a proteger sua população e responsabilizar os indivíduos que cometeram atrocidades nas províncias. Ademais, se propuseram a ajudá-los nesse papel de combate aos grupos extremistas que atuam no país. Já em junho do mesmo ano, o Escritório das Nações Unidas para a Coordenação de Assuntos Humanitários também foi outro agente que forneceu assistência a Moçambique através de recurso financeiro humanitário de cerca de 103 milhões de dólares, não só para a crescente onda de violência, mas também para a Covid-19. Em 2021, ainda houve uma tentativa por parte da Comunidade de Desenvolvimento da África Austral de realizar uma cúpula onde seria discutida a violência em Cabo Delgado, contudo ela teve que ser adiada devido ao avanço da Covid-19.

As forças de segurança governamentais devem garantir a proteção de civis e deslocados internos em Cabo Delgado. Todas as operações militares contra o Al-Shabaab devem ser realizadas com estrita observância ao direito internacional. Além disso, a comunidade internacional – União Africana, UE, SADC, ONU e Estados vizinhos – precisa auxiliar no combate ao Al-Shabaab e à ameaça do extremismo violento que assola Moçambique. 

Links adicionais:

UN News no Twitter com vários posts sobre o caso:

https://twitter.com/UNOCHA_ROSEA

Crisis Group explica a atuação do Al-Shabaab em toda África Oriental

https://www.crisisgroup.org/africa/horn-africa/kenya/265-al-shabaab-five-years-after-westgate-still-menace-east-africa

Referências:

International Crises Group. Post-election Mozambique: Here comes an era of uncertainty. Disponível em: <https://www.crisisgroup.org/africa/southern-africa/mozambique/post-election-mozambique-here-comes-era-uncertainty> Acesso em: 9 de maio de 2021.

Global Centre for the Responsibility to Protect. Attacks by armed extremists from “Al-Shabaab” leave populations in Mozambique at risk of atrocity crimes. Disponível em: <https://www.globalr2p.org/countries/mozambique/> Acesso em: 9 de maio de 2021.

UN News. Thousands on the move after brutal attacks in northern Mozambique, UN office reports. Disponível em:< https://news.un.org/en/story/2021/04/1088962 >. Acesso em: 11 de maio de 2021.