Conflito Curdo-Iraquiano

24 de janeiro de 2022

Autor: Isabela do Canto

Este conflito teve como principais agentes o governo iraquiano, na época liderado pelo ditador Saddam Hussein, e os curdos, predominantemente das regiões norte e nordeste, região conhecida como “Curdistão iraquiano”. Apesar das ações do governo iraquiano terem sido retaliações contra peshmergas (rebeldes curdos) que apoiaram o Irã durante a Guerra Iraque-Irã (1980-1988), elas não se restringiram apenas aos peshmergas, mas a todo o povo curdo, já há muito perseguido no país.

O povo Curdo é uma etnia do Oriente Médio, originária das montanhas do sul da Síria e do Norte do Iraque, cujo território  atualmente se estende pela Armênia, Azerbaijão, Irã, Iraque, Síria e Turquia. Há uma luta pelo reconhecimento da formação do Estado do Curdistão que encontra forte resistência por se tratar de uma região rica em recursos naturais, como petróleo. 

No Iraque, esse povo viveu intensa  perseguição e enfrentou diversos conflitos, como a Primeira Guerra Curdo-Iraquiana (1961-1970) e a Segunda Guerra Curdo-Iraquiana (1974-1975), com tentativas de acordo de paz e firmamento de zonas autônomas curdas, ao mesmo tempo em que o governo iraquiano promovia a arabização de regiões ricas em petróleo, como Kirkuk e Khanaqin. 

Vê-se que, antes mesmo da ascensão de Saddam Hussein ao poder como ditador do Iraque, havia tensões e conflitos recorrentes entre os grupos já citados. A repressão, conhecida pelo nome  Anfa, não se restringia a suprimir aspirações separatistas, se estendendo a censurar a cultura curda e o uso da língua. 

Entretanto, durante a guerra contra o Irã (1980-1988),  o Iraque perdeu o controle de diversas regiões curdas, e viu o apoio de muitas delas ao exército iraniano. Entre 17 e 18 de março de 1988, como retaliação a esse apoio e para reaver o domínio territorial, o governo bombardeou o povoado de Halabja com armas químicas, onde foram declaradas “zonas proibidas”, considerando todos os moradores insurgentes para justificar a ação. Depois de ser bombardeada, a vila foi invadida.

Violações 

As principais violações cometidas durante o Conflito Curdo-Iraquiano foram genocídio e limpeza étnica. O genocídio é definido pela Convenção de Genebra, de 1948, como “ato cometido com a intenção de destruir, inteiramente ou em parte, uma nação, uma etnia, uma raça ou um grupo religioso”, enquanto a limpeza étnica é  “a remoção, eliminação ou a migração forçada de determinados grupos étnicos em uma região”.


Fonte: Veja – Homem curdo abraça seu filho em Halabja, nordeste do Iraque. Ambos foram mortos em um ataque químico ordenado pelo governo iraquiano contra a cidade – 20/03/1988 IRNA/AFP 

Entre 1987 e 1989, foram realizados vários ataques do governo no norte do país, mas o  bombardeio de Halabja recebeu maior destaque pelos 5 mil mortos, além de ter sido ocasionada por um ataque químico, hoje proibido. Este bombardeio, em si, é caracterizado como genocídio, já que visava destruir e afetar o povo curdo que habitava a região, não apenas os rebeldes, o que significaria perseguição política. Por ter afetado predominantemente civis desta etnia, foi classificado pelo Tribunal de Haia como genocídio e muitos dos políticos envolvidos neste ataque foram sentenciados por tal posteriormente. 

Esta não foi a única ação cometida pelo governo iraquiano, já que ele também forçou a fuga de grupos que viviam nas fronteiras com o Irã e a Turquia, uma limpeza étnica que gerou o deslocamento de milhares de curdos para a Europa e outros países do Oriente Médio.

Atores externos envolvidos

A ação de agentes internacionais não se deu durante os conflitos, mas com a invasão do Iraque entre os anos de 2003 e 2005 pelos Estados Unidos. Esta invasão resultou na derrubada da ditadura de Saddam Hussein, o que gerou uma maior autonomia curda. 

O Tribunal de Haia também teve uma importância fundamental por ter julgado os crimes cometidos pelos integrantes do governo ligados aos ataques. Saddam Hussein, por exemplo, foi condenado à morte por enforcamento pelos crimes contra a humanidade – antes de responder pelo crime de genocídio contra os 180 mil curdos assassinados durante a operação Anfa. Seu sobrinho e principal assessor também foi condenado. Conhecido como  “Ali, o alquimista”, o general Ali Hassan al Majid foi enforcado em 2010 por ter ordenado este e outros ataques. Também foram condenados à morte o ex-ministro iraquiano da Defesa, Sultan Hachim al-Tai, e Hussein Rachid al Tikriti, ex-diretor adjunto das operações militares no Iraque. Outros dois acusados, Farhan al Juburi e Sabir al Duri, ex-responsáveis pelos serviços de inteligência militar, foram condenados à prisão perpétua.

Referências Bibliográficas

https://www.aljazeera.com/opinions/2021/12/15/the-kurds-could-be-kingmakers-in-iraqs-new-government

https://www.aljazeera.com/features/2014/4/14/iraq-kurds-press-states-to-recognise-genocide

https://g1.globo.com/Noticias/Mundo/0,,AA1571629-5602,00-ANFAL+O+GENOCIDIO+DE+SADDAM+HUSSEIN+CONTRA+OS+CURDOS.html

https://www2.senado.leg.br/bdsf/bitstream/handle/id/315364/noticia.htm?sequence=1

https://www2.senado.leg.br/bdsf/bitstream/handle/id/317875/noticia.htm?sequence=1

https://www.aljazeera.com/opinions/2016/3/16/remembering-halabja-chemical-attack

https://www.correiobraziliense.com.br/app/noticia/mundo/2019/07/23/interna_mundo,773123/dezenas-curdos-executados-sob-o-regime-de-saddam-hussein-sao-exumados.shtml