19 de julho de 2021
Partes envolvidas
O conflito se deu entre as principais elites locais, tendo como representantes o presidente da época, eleito em 2002, Mwai Kibaki, e Raila Odinga, como opositor do Partido Democrático Laranja (ODM). O início dos conflitos se deu em 27 de dezembro de 2007, após o resultado da eleição presidencial ter afirmado que Kibaki havia sido reeleito. Essa vitória trouxe uma suspeita de fraude eleitoral, que veio a ser confirmada posteriormente com a apuração da União Europeia, além de protestos convocados pela ODM. Enquanto o presidente reeleito, Kibaki, tentava mediar a situação, pedindo moderação aos manifestantes e propondo um governo de coalizão com a oposição, Odinga incentivava os protestos e pedia uma declaração de reconhecimento da derrota. Além da fraude eleitoral, o problema fundamental foi a violência, tanto praticada pelos Estados, quanto pelos próprios cidadãos, que cometeram crimes até hoje não julgados, com um fundo intrincado nos conflitos étnicos advindos da colonização inglesa.
Contexto político
O Quênia, antes do conflito de 2007, era considerado a maior potência do oeste da África, além de ter uma imagem tradicionalmente pacífica. Apesar de todo esse potencial, o país enfrenta conflitos periódicos, principalmente em época de eleições, o que contradiz a ideia de que o embate de 2007 foi algo isolado. Em 1992, por exemplo, 1500 pessoas morreram também em conflitos políticos, apesar de não em condição idêntica à estudada.
Esses conflitos políticos são decorrentes da herança britânica que, com sua colonização, sublinhou divisões no país e fez com que cada grupo votasse no partido que representa sua etnia hoje, buscando mais representação política e justificando a tensão recorrente no período eleitoral. O país já tinha tensões políticas há décadas, que foram apenas expostas pelo conflito em 2007, que matou, em alguns dias, 1500 pessoas e deslocou de suas casas 300.000, com uma população de 38,71 milhões naquele ano (Fonte: Banco Mundial).
Violações
A colonização britânica aumentou as divisões e conflitos étnicos no país. Dos mais de 40 grupos étnicos, o kikuyu é o principal, com cerca de 22% da população do Quênia. Em seguida há o luhya, com 14%, o luo tendo cerca de 13%, o grupo kalenjin com 12% e, por fim, o kamba com um total de 11% da população. Por trás das manifestações e conflitos pós-eleição de 2007, pode-se observar duelos entre tribos rivais, as quais tinham por objetivo ampliar seu poder, território e riquezas, através do apoio dado ao candidato eleito ou à oposição. A maior parte dos luo votou em Odinga, por ser próprio do grupo. Enquanto a maioria dos Kikuyus optou por Kibaki. De acordo com a então subsecretária de Estado estadunidense para Assuntos Africanos, Jendayi Frazer, estava ocorrendo uma limpeza étnica – a qual é comumente tida como remoção forçada de um grupo étnico de determinado território. Já de acordo com o Tribunal Penal Internacional, os crimes cometidos no pós-eleição chegaram ao nível de crime contra a humanidade – que é considerado como violência sistemática ou generalizada contra civis.
Entre os meses de dezembro de 2007 e fevereiro de 2008, cerca de 1.133 quenianos foram mortos, 900 sofreram estupros e violência sexual, 600.000 pessoas tiveram de sair de suas casas, com deslocamentos internos ou para países vizinhos, como Uganda, enquanto 110.000 propriedades privadas foram destruídas como consequência dos embates.
Atores externos envolvidos
A União Africana (UA), com o apoio da Organização das Nações Unidas (ONU), países vizinhos, doadores e sociedade civil foram essenciais para a ação internacional ser tomada rapidamente. O processo de mediação de 41 dias, liderado pela União Africana, é considerado o primeiro caso de sucesso da Responsabilidade de Proteger na prática. Tanto o presidente eleito, Kibaki, quanto o candidato da oposição, Odinga, foram convocados a solucionar a crise através do diálogo, sem condições prévias. Tendo o fato das instituições do país serem fracas, reformas foram pensadas como uma maneira de evitar novos conflitos. Além disso, o Tribunal Penal Internacional denunciou três indivíduos, tomando por base a alegação de que crimes tenham sido cometidos durante a crise. Essa lista de indivíduos inclui o atual presidente queniano, Uhuru Kenyatta, o qual teve as acusações retiradas. Em relação aos outros dois, William Ruto e Joseph Arap Sang, tiveram suas incriminações também abandonadas.
Também são suspeitos de incentivo ao conflito étnico e crimes de guerra muitos empresários e políticos, que podem atuar de maneira a diminuir a chance de os processos serem levados à frente, havendo, ainda hoje, muitos culpados não tendo sido levados a julgamento pelo Tribunal Penal Internacional de Haia. Também nada se faz pelo julgamento dos cidadãos que cometeram crimes, tornando a população ainda muito temerosa.
Referências Bibliográficas
Al Jazeera. ICC issues deadline on Kenyatta’s trial. Disponível em: https://www.aljazeera.com/news/2014/12/3/icc-issues-deadline-on-kenyattas-trial.
Al Jazeera. Kenya: One year on. Disponível em: https://www.aljazeera.com/news/2008/12/27/kenya-one-year-on.
Al Jazeera. Kenya: What went wrong in 2007. Disponível em: https://www.aljazeera.com/features/2013/3/3/kenya-what-went-wrong-in-2007.
Al Jazeera. ‘Trial set’ for Kenyans over 2007 violence. Disponível em: https://www.aljazeera.com/news/2012/6/11/trial-set-for-kenyans-over-2007-violence.
BBC. Entenda a crise no Quênia. Disponível em: https://www.bbc.com/portuguese/reporterbbc/story/2008/01/080102_queniaentenda_ac
Brasil Escola. A crise no Quênia. Disponível em: https://brasilescola.uol.com.br/geografia/a-crise-no-quenia.htm.
G1. Entenda o conflito no Quênia. Disponível em: http://g1.globo.com/Noticias/Mundo/0,,MUL280058-5602,00-ENTENDA+O+CONFLITO+NO+QUENIA.html.Global Centre for the Responsibility to Protect. Kenya. Disponível em: https://www.globalr2p.org/countries/kenya/.