Migração Forçada e Atrocidades Massivas

28 de junho de 2021

Atrocidades massivas são crimes que afetam civis em larga escala e de forma duradoura. Contudo, há alguns grupos que são especialmente afetados por essas atrocidades: os refugiados e os deslocados internos. Crimes contra a humanidade, crimes de guerra, genocídio e limpeza étnica são práticas que geram medo aos civis alvo e também aos civis em áreas próximas de ataques.  

Essas migrações forçadas estão conectados com atrocidades massivas de 3 formas diferentes: 

1) Migrações forçadas podem ser um produto de atrocidades quando as pessoas querem fugir dos crimes cometidos;

2) Migrações forçadas podem ser uma forma em si de atrocidade, como deportação ou transferência forçada;

3) Respostas baseadas no R2P podem levar a deslocamentos, visto que as pessoas procuram por segurança nas proximidades dos campos de peacekeeping.

Apesar de haver regimes que são pensados para proteger esses grupos no Direito Internacional, existem alguns problemas. A Convenção para Refugiados se torna muito limitada ao deixar a decisão de proteção à mercê dos Estados receptores. Já os deslocados internos são submetidos à proteção pelos seus Estados de origem, o que pode ser preocupante dado que esses Estados estão lidando com as atrocidades que geraram os deslocamentos. 

Dadas as limitações legais nos regimes internacionais, os Princípios Orientadores Relativos aos Deslocados Internos incluem casos em que o deslocamento é baseado em:

1) Práticas similares à limpeza étnica ou que alteram a composição populacional em termos étnicos, religiosos ou raciais;

2) Situações de conflito armado, com exceção dos casos em que a segurança dos civis envolvidos demandem;

3) Quando é utilizado como punição coletiva.

Neste sentido, o R2P, enquanto doutrina que estabelece a responsabilidade de agir contra atrocidades massivas por parte dos países e da comunidade internacional,  pode servir como uma importante alternativa para a comunidade internacional intervir nesses casos, podendo culminar até no uso da força. 

Modificações no âmbito da Assembleia Geral da ONU e do Conselho de Segurança implicam que a antiga prática de requerimento de consentimento do Estado para agir em seu território foi substituída pela simples notificação das ações internacionais nesse Estado, permitindo assistência mais rápida e efetiva através das fronteiras. Algumas mudanças também apontam para a tentativa de restrição do poder de veto dos membros permanentes do Conselho de Segurança, ou no comprometimento em não utilizar o veto em questões de atrocidades massivas. Até então, apenas declarações têm sido feitas e apoiadas por alguns países.

Outra forma importante de atuar nessas atrocidades é pela Revisão Periódica Universal do Conselho de Direitos Humanos da ONU, feita a cada 4 anos e meio a todos os países membros das Nações Unidas. Esse mecanismo permite que o país seja responsivo por 2 motivos: 

1) Produz uma informação detalhada e robusta pelo país passando pela revisão, pelos relatórios da Comissão, por ONGs, instituições/agências nacionais e recomendações de outros países.

2) Os países sob revisão podem indicar quais recomendações acolhem e como podem incrementar as sugestões trazidas.

Como vimos, migrações forçadas são diretamente associadas a esses crimes e à falta de ação das autoridades e da comunidade internacional. Alguns exemplos mostram como crimes contra a humanidade, limpeza étnica, crimes de guerra e genocídio afetam os civis de determinado país. Mais especificamente, veremos o caso da Síria e da Etiópia.

Síria: Em março deste ano foram marcados 10 anos da terrível guerra no país. O que começou com protestos contra corrupção e violações de Direitos Humanos escalou para uma guerra civil graças à repressão do governo e à organização de grupos armados. Desde 2013, mais de 13 milhões de sírios foram deslocados, vítimas de crimes de guerra e crimes contra a humanidade. Entre os registros, então ataques a escolas, hospitais, mercados, campos de refugiados, uso de armas químicas, bombardeios, tortura e violência sexual.

Ações derivadas do R2P têm sofrido problemas em atribuir responsividade na Síria pelas atrocidades cometidas, dado que o Conselho de Segurança possui veto da Rússia e da China em pautas de intervenção.

Etiópia: Em novembro, a região de Tigré passou a ser o centro de uma guerra política que escalou em conflito étnico. A Frente de Libertação do Povo Tigré (TPLF) perdeu a hegemonia política depois de décadas quando Abiy Ahmed assumiu o poder.  Ahmed, ganhador do prêmio Nobel da Paz em 2019, perpetrou ataques aéreos e terrestres na região como uma política anti rebeldes.  O conflito tem gerado refugiados e deslocados que seguem para o Sudão, Eritreia e uma outra região da Etiópia chamada Amara. Contudo, em Amara, o grupo étnico majoritário tem atacado deslocados internos vindo de Tigré. A violência tem sido devolvida com mais conflitos e mortes.

Atualmente, há mais de 1.7 milhões de deslocados, sofrendo com assassinatos, violência sexual, ataques a acampamentos de refugiados, destruição de centros de saúde e bloqueio a meios de informação e rotas de ajuda humanitária. A comunidade internacional alega não ter meios de ajudar efetivamente por conta das dificuldades de acesso instaladas pelos governos e grupos étnicos contrários ao povo de Tigré.

Referências

https://www.ft.com/content/31bd995c-5991-4247-9f69-cea858895fb1 

https://ociufpe.wordpress.com/2021/05/31/etiopia-em-crise-um-conflito-multilateral/

https://www.oxfordhandbooks.com/view/10.1093/oxfordhb/9780198753841.001.0001/oxfordhb-9780198753841-e-32

https://reliefweb.int/report/ethiopia/atrocity-alert-no-239-ethiopia-china-and-iraq

https://reliefweb.int/report/syrian-arab-republic/decade-atrocities-and-international-failure-syria